Crédito de Carbono: Implicações da Lei nº 14.590/2023 - Confira novo artigo de Kênia Caldeira Costa
Artigo discute nova lei que objetiva destravar projetos de geração de Crédito de Carbono em áreas públicas, potencializando o instituto da Concessão Florestal no Brasil
A tendência mundial das grandes instituições segue consagrando as práticas relacionadas às condutas ESG – Environment, Social & Governance – que englobam, dentre outras agendas, o instituto do Crédito de Carbono, que é um certificado negociável, cuja aquisição é regulamentada para compensar ou neutralizar as emissões de CO2 liberadas na atmosfera, derivadas das atividades de determinada empresa ou cadeia produtiva.
Em artigo anterior, que você poderá ler a íntegra aqui, discuti o quanto a preocupação com o meio ambiente, há muito, deixou de ser atenção exclusiva de ativistas ambientais para se tornar agenda corporativa por consciência e estratégia de mercado dos empreendedores grandiosos.
Especialmente com relação à geração de Créditos de Carbono, o Brasil possui enorme potencial para implementação de políticas públicas que visem a geração e a negociação de créditos de carbono, notadamente, pela grande extensão territorial de áreas públicas com cobertura vegetal ou florestal extremamente aptas à neutralização de CO2. Contudo, ainda são poucos os precedentes que abordam a possibilidade de geração de créditos negociáveis por meio da conservação ou restauração de florestas públicas e, até o presente, nenhuma das experiências registradas no país envolveu a delegação, de tal possibilidade, à iniciativa privada por meio do regime de concessão.
Atualmente, é conceito superado que desenvolvimento econômico e preservação ambiental representam uma dicotomia, e reconhecendo o valor do equilíbrio entre esses interesses é que novas diretrizes para o uso de concessões, possibilitando a o uso de áreas públicas para a implementação de atividades econômicas sustentáveis, estão sendo pautadas no ordenamento jurídico nacional.
Acompanhando a inclinação global, no dia 24 de maio de 2023, o Chefe do Executivo sancionou o projeto e promulgou a Lei nº 14.590/2023 que objetiva precipuamente destravar projetos de geração de Crédito de Carbono em áreas públicas, potencializando o instituto da Concessão Florestal. A principal novidade trazida pela Lei nº 14.590/2023 está na permissão legal para outorga, ao concessionário, do direito de comercializar os Créditos de Carbono derivados de conservação de florestas naturais. Além disso, o diploma legal estabelece que o contrato de concessão poderá prever a transferência de titularidade dos Créditos de Carbono do poder concedente ao concessionário, durante o período da concessão, bem como, o direito de comercializar certificados representativos de Créditos de Carbono e serviços ambientais associados, na forma disposta no edital de licitação da concessão.
Quanto ao seu alcance, a norma prevê que os contratos de concessão vigentes em 25 de maio de 2023 poderão adaptar-se às novas disposições, desde que com a concordância expressa do poder concedente e do concessionário. A norma aprovada, seguramente, representa um passo relevante para fomentar o mercado de compensação de emissões, vez que incita o fluxo financeiro privado para restauração e proteção ambiental em florestas públicas e unidades de conservação, concebendo estímulo econômico aos interessados, na medida em que prevê a transferência de titularidade do poder concedente para o concessionário e a possibilidade de negociação de Créditos de Carbono derivados das áreas públicas sob concessão.
A Lei nº 14.590/2023 ultrapassa o papel de apenas estabelecer regras e padrões para avalizar a proteção e a conservação das florestas públicas, inova e pauta no ordenamento jurídico nacional, a possibilidade de criação de oportunidades econômicas em áreas antes limitadas. Nessa abordagem, que congrega proteção ambiental à geração de renda, temos um importante avanço na busca e implementação do efetivo desenvolvimento econômico sustentável.
Sob o viés ambiental, a lei traz reflexo direto no combate ao desmatamento e regeneração de áreas degradadas, uma vez que a previsão da concessão pública condiciona o ente privado à recuperação destas áreas. Sob a ótica econômica, a expectativa do impacto da Lei nº 14.590/2023 é que a norma impulsione o mercado de Crédito de Carbono, permitindo ao setor privado acesso a áreas públicas com enorme potencial de geração de receitas por meio da negociação dos créditos de carbono equivalentes. Fomenta, portanto, a oferta de títulos compensatórios que poderão suprir a demanda das empresas interessadas em compensar ou neutralizar as emissões provenientes de suas cadeias produtivas.
Por sua vez, sob a ótica do interesse público, a Lei contribui ainda para a desoneração dos entes federativos em relação à manutenção e conservação das áreas protegidas, permitindo, por sua vez, a destinação dos recursos públicos a outras demandas da sociedade. Trata-se de interesse convergente do Estado e da iniciativa privada em manter desenvolvimento econômico e a preservação ambiental em ascensão.
Nesse sentido, a regulamentação do assunto se mostra atraente para todos os segmentos corporativos que direcionam suas atividades à transição para a economia de baixo carbono. Aliada a questão ambiental e econômica, incontestável que associar-se às práticas ESG, dentre elas, a utilização de Crédito de Carbono para a mitigação dos impactos derivados da atividade empresarial, eleva o valor das marcas junto a clientes e mercado, além de abrir novas possibilidades para o crescimento e visibilidade das empresas, tornando-se, cada vez mais, fundamental para a captação de recursos de organismos multilaterais, bancos, fundos de impacto e de descarbonização, investidores institucionais engajados na agenda ESG – Environment, Social & Governance e ilimitados setores privados (construção civil, agronegócio, mineração, logística…).
Um exemplo palpável dos benefícios já concedidos às empresas pela utilização de Créditos de Carbono, para a neutralização ou compensação das emissões de CO2, na forma abarcada pela lei, se mostra pela existência de programas governamentais e, mesmo de organismos multilaterais, como o Banco Mundial e o BID, para o financiamento da produção de empresas ou setores produtivos comprometidos com dos pilares conceituais ESG – Environment, Social & Governance, e que adotam práticas de produção sustentáveis.
Assim, as inovações regulatórias criam um ambiente seguro juridicamente de negócios que pode ser transformador e fundamental para a atração de recursos de organismos multilaterais, bancos, fundos de impacto e de descarbonização, investidores institucionais engajados na agenda ESG – Environment, Social & Governance e ilimitados setores privados (construção civil, agronegócio, mineração, logística…).
Por fim, o momento sugere que aconselhadores jurídicos atualizem suas orientações e planejem estratégias exequíveis e economicamente proveitosos aos interessados no mercado de Créditos de Carbono para atribuir evidência e diferencial aos seus clientes.
Kênia Caldeira Costa é Supervisora do Cível (BH) no Marcelo Tostes Advogados.